-Bom dia senhor António. – Respondeu Diogo.
-Bom dia pai. –
Mas ao contrário dos rapazes, Sofia nada respondeu.
-Dormiram bem?
-Sim, o colchão até é bastante confortável.
-Também dormi bem, o calor é que me fez demorar a
adormecer. – Disse Filipe. –E pai, a Sofia está aqui porque é
sonâmbula, é capaz de ter vindo para aqui durante um sonho.
-Por isso é que encostaram a porta, para ela não fugir
daqui.
-Sim, foi para te proteger a ti e á mãe.
-Para a próxima então, deixa então a janela aberta para o
ar não ficar tão abafado. – Abriu a janela e
foi até á porta mais uma vez. –São três
pessoas a respirar o ar do mesmo quarto. Mas vá lá meninos, despachem-se que o
pequeno-almoço está na mesa. – Saiu do quarto e foi em direção á cozinha.
-Que eu saiba não és sonâmbula.
-Então é porque não sou.
-Então porque dormiste aí? – Sofia podia dizer a verdade, que estava a chorar antes
de dormir e Filipe a chamara para se deitar ao pé de si para a animar, mas não
queria que ninguém o descobrisse. Apenas Filipe que o descobriu sem querer.
-Porque eu a chamei. Estavas a ocupar a cama praticamente
toda e ela quase não tinha espaço para estar deitada. – Respondeu Filipe, mentindo, mas apenas para proteger a
amiga.
-É bem capaz, tive sonhos muito estranhos! – Aceitou calmamente Diogo. - Mas vocês aproveitaram para outras coisas não foi?
-Se te disser que não, estou a mentir, por isso prefiro
não te responder. – Disse Sofia.
-Se me respondesses que sim, diria que vocês são muito
corajosos! Estavam na mesma casa que os pais dele e fizeram! E tiveram coragem
para fazer no mesmo quarto que eu! O que vale é que até foram silenciosos. – Sorriram. –Sofia
tens o peluche no chão. – Era um dos objetos que tinham mais simbolismo
para Sofia, para além do anel presente no dedo anelar da mão direita.
-O peluche chama-se Miguel. – Respondeu friamente.
-Vamos comer? O meu pai já está à nossa espera. – Disse Filipe mudando de assunto.
-Claro! Sofia tens a pulseira no chão. – Afirmou Diogo demonstrando alguma frieza nas palavras,
não era pelo simples facto dela ter ou não a pulseira, mas sim porque a irmã e
o amigo insistiam em repetir o mesmo erro, mas desta vez, bem
próximo do seu “olhar” atento. Ela pegou na pulseira e colocou-a no seu pulso e foram até á
cozinha, António estava a preparar as bebidas junto á máquina do café, e Filipe aproximou-se
da bancada, para ir preparar torradas. Tinha o corpo despido e estava de costas
voltadas para todos, e foi bem visível aos olhos de todos as marcas presentes
nos ombros dele. Eram várias arranhadelas, umas mais profundas que outras mas
sempre em série de quatro, pareciam ter sido de dois gatos zangados que tinham
andado á luta nas costas dele. Mas, mesmo lá no fundo, todos sabiam como tinham
surgido aquelas marcas. Mas só poderia ter
sido Sofia a fazê-las, apesar de inconsciente. Preferia não
acreditar, de certeza que o tinham magoado noutra situação, mas assim como as
marcas continuavam presentes, era natural que ainda causassem alguma dor.
António observou, em simultâneo com Sofia e Diogo, durante alguns
segundos, mas nada disse, simplesmente fingiu não ver. Voltou a virar-se para a
bancada e perguntou:
-Alguém quer café? –
Diogo e Filipe responderam positivamente e Sofia pelo contrário, optou por
beber um copo de leite frio.
-Querem torradas? –
Perguntou Filipe ainda de costas para todos, deixando Sofia cada vez mais
envergonhada, o irmão olhou para ela que corou e baixou a cabeça. Fingiu
levantar-se para procurar açúcar e colocou-se ao lado dele e sussurrou-lhe:
-Vai vestir uma t-shirt, depois explico-te. – Sentou-se á mesa e Filipe foi até ao quarto onde vestiu
a t-shirt e rapidamente voltou para a mesa da cozinha, por sorte ninguém lhe
perguntou porque o tinha feito. Começaram a comer e algum tempo depois terminaram,
Sofia ficou a arrumar a cozinha enquanto António foi embora em direção ao
trabalho e enquanto Filipe e Diogo foram-se despachar para ir para o treino.
Quando terminaram despediram-se, e Sofia ficou mais uma vez sozinha.
Tinha de fazer alguma coisa
para não começar a pensar demasiado na sua vida, para não chorar com todas as
recordações que o coração fazia questão de nunca esquecer, não queria dormir,
sentia-se demasiado energética para isso, por isso decidiu fazer algo que não
fazia desde que regressara de Espinho, dedicou-se a uma das suas paixões, a
escrita.
“Querido Pedro,
Sabes quantas vezes sorri
por tua causa? Sabes quantas vezes chorei por não te ter ao meu lado? Deves
estar “alapado” no sofá a ver um jogo ou a treinar, feliz, e nem sabes a
montanha-russa que se tornou a minha vida, sem ti. Mas deixa-me contar-te tudo
o que sinto. Tenho saudades tantas saudades tuas, saudades que nem te passa pela cabeça.
Saudades dos nossos momentos, dos nossos beijos e das tuas palavras, saudades
do tempo em que viviamos como se fossemos um, porque sem ti, estou incompleta.
E por isso mesmo, nem quando estou com outra pessoa te esqueço, meu amor. Tu és
a minha vida e a minha única paixão.
E é por te amar como
nunca amarei mais ninguém que não desisto de lutar por ti, porque acredito que
podemos estar juntos novamente. Podes nunca ler este pequeno desabafo mas serve
para mostrar o que sinto por uma das pessoas mais bonitas que conheci até hoje,
tu. E nunca me irei esquecer do pequeno ser que desenvolvemos no meu corpo, que
aquele homem sem coração, me obrigou a expulsar. E sim, agora estou aqui, em
casa, bem próximo de ti, mas ao mesmo tempo tão longe e olho para todos os
momentos que passamos juntos, e só com uma palavra que resume tudo o que sinto:
saudades! São apenas 7 letras, com 3 sílabas mas muito significado, nunca
duvides que eu te amo, como mais nenhuma te ama.
Da
mulher que nunca te esquecerá,
Sofia
Roch(inh)a “
Perdera já a conta ás vezes
que chorou por causa da sua bonita, mas sofrida história de amor, mas era a
primeira vez que Pedro a fizera chorar. Nunca duvidara até então que o
sentimento era recíproco, mas depois de o ver a beijar aquela rapariga, começou
a duvidar dos seus verdadeiros sentimentos. No lugar dele teria esperado, nunca
desistiria do verdadeiro amor.
Tinha sido com Pedro o seu
primeiro beijo, e foi também com ele que fez pela primeira vez amor, era ele o
pai do filho que perdera, tinha sido ele
o seu primeiro e único amor, como poderia simplesmente... Esquecer tudo? Sim, tinha-se
relacionado com Filipe, já o assumira a si mesmo e pesara-lhe a consciência,
mas nunca esquecera de Pedro, nem por um segundo, enquanto esteve com Filipe.
Limpou as lágrimas que escorriam pelas bochechas e foi tomar banho, para
recuperar as forças e sentir “leve” vestiu-se e depois maquilhou-se. Iria lutar
por ele e pela felicidade junto de Pedro. Pegou num lápis e começou a desenhar,
gostava de o fazer sim, mas não o sabia fazer tão bem quanto Pedro. Mais uma vez lembrou-se do sorriso genuíno que ele tinha, um sorriso tímido ao início, mas que começava a revelar-se com o passar dos tempos. Depois de ter o desenho pronto, saiu de casa. Sabia bem o que ia fazer com o desenho, tinha tudo bastante pensado na sua mente. Pedro iria sempre fazer parte do seu coração, iria ser para sempre um exemplo e a história. Ele iria sempre fazer parte do coração de Sofia, e ela iria demonstrá-lo no seu corpo. Tatoou o nome dele. Pagou e regressou a casa.
Esperou pouco tempo em casa
pelo irmão que quando chegou lhe pediu para ir até ao carro. Iriam almoçar fora
de casa e traziam companhia. Sofia, no seu íntimo, queria que fosse Pedro,
queria vê-lo novamente, conversar, mas sabia que o irmão não iria juntar Filipe
e Pedro, consigo. Saiu da vivenda enquanto o irmão ficou no seu interior
procurando o telemóvel que tinha lá deixado, e olhou para todos os lados, e nem
sinal do carro nem de Filipe, nem de Diogo. Voltou mais uma vez a observar a
rua e ouviu:
-Soff! –
Filipe chamara-a de um carro amarelo que era de todo desconhecido. Ela
aproximou-se e olhou para o lugar do condutor, nunca tinha falado com ele, mas
sabia quem era. Os dois ambos saíram do carro e Filipe continuou a falar. – Espero que não te importes, mas trouxe
companhia para nos ajudar a ver casas. – O rapaz deu uma palmada com pouca
força na cabeça de Filipe e disse:
-E apresentares não? –
Aproximou-se dela e deu-lhe dois beijos na face. –Bernardo Silva.
-Sofia Rochinha. –
Respondeu. – Prazer.
-O prazer é meu e é todo na cama. – Disse Filipe e Sofia corou, claramente dissera aquilo
para brincar com o facto de se envolverem, mas ela ficou envergonhada mesmo
assim.
-Mas alguém te perguntou alguma coisa Pipinho? – Sofia não conseguiu conter uma gargalhada.
-Pipinho é muito bom!
-És irmã do Diogo, certo?
-Sim, sou.
-Não são nada parecidos. Mas eu deduzi logo pelo apelido.
-Temos poucas semelhanças fisicamente, isso é verdade.
-Já vi que te deste bem com o meu melhor amigo. – Disse Bernardo.
-Sim, já o conheço há mais de um ano e agora que vivemos
juntos ainda nos tornamos mais próximos.
-Pudera... –
Disse Filipe em tom de sussurro.
-E como é que consegues viver com este cabeçudo? Só a
cabeça dele ocupa meia casa. –
Sofia sorriu.
-E partilho quarto com ele, por isso imagina o meu
sofrimento! – Sofia começou também a
brincar com a situação. – Pelo menos até
encontrarmos uma casa para vivermos os três.
-Tem de ser uma casa grande com aquelas duas cabeças. – Filipe limitava-se a não responder.
-E a minha? –
Perguntou ela.
-A tua não. A tua é de tamanho normal. – Sorriram. – És
mais velha ou mais nova que o Diogo?
-Mais nova, não chega a um ano.
-Então ainda és menor.
-Sim, só faço os dezoito em Março.
-Ele pode ser? –
Pronunciou-se Filipe. – Ele é meu melhor
amigo, gostava de ter uma opinião dele.
-Pode, mas ele que não conte a ninguém.
-Voltei meninos. –
Disse Diogo surgindo e interrompendo a conversa. – Desculpem a demora mas o telemóvel estava bem escondido.
-Não faz mal Diogo, estive aqui a falar com o Bernardo. – Respondeu animada Sofia.
-Nada de tentares nada com a minha irmã, já me basta o
Filipe. – Sofia corou, o irmão
estava a tentar protegê-la mas também, por vias de facto, a afastar uma das
pessoas que a fizeram rir naturalmente, apesar de ter sido durante um curto
espaço de tempo. Entraram para o carro sem dizer nada. Começaram o caminho e
Diogo perguntou, claramente fugindo a qualquer pergunta indiscreta de Bernardo
sobre aquela “relação” de Filipe e Sofia:
-Então e a Clara?
-Clarinha senão te importas. – Respondeu Bernardo sorrindo. –Está no norte. – Respondeu claramente desanimado. – Mas vem cá no fim de semana para matarmos
saudades!
-Ela deixou-te mesmo bonito... – Disse Filipe brincando com o amigo.
-Eu já era bonito, mas ela tornou-me ainda mais! Tu estás
é com inveja de eu ter alguém que goste mesmo e da nossa relação e tu, parvo
não tens porque és parvo e não fazes nada.
-Mudando de assunto... –
Acrescentou Filipe. – Como é que
consegues manter uma relação á distância? Quer dizer, não ficas a morrer de
saudades dela?
-Sim, óbvio que sim. E não é fácil, é preciso haver muita
confiança um no outro e gostarmos ainda mais da outra pessoa. Mas o facto de
não estarmos juntos quando queremos, mas sim quando pudemos ainda nos aproxima
mais, porque aproveitamos cada segundo como se fosse o último. Claro que
preferia tê-la aqui, mas desde que a tenha comigo é o que importa!
-Oh que romântico! –
Respondeu Sofia claramente emocionada. –
Como é que se conheceram?
-Ela era minha fã, falamos algumas vezes pelo facebook,
ela foi ver uns jogos meus, depois conversa puxa conversa e acabou por
acontecer. Mas pior foi conversar com o pai dela e explicar tudo, afinal são
alguns anos de diferença.
-Há quanto tempo estão juntos? Senão for muito indiscreto
perguntar, é claro.
-Sete meses, faz daqui a oito dias. – Respondeu claramente orgulhoso.
-Muitos parabéns Bernardo! – Respondeu claramente feliz por ele. –Se alguma vez precisares de ajuda ou de
algum apoio conta comigo!
-Obrigada Sofia! –
Respondeu estacionando o carro. – Posso
fazer-vos uma pergunta mais indiscreta, Filipe e Sofia?
-Sim... Podes. –
Disse Sofia claramente envergonhada.
-Vocês já se envolveram ou estiveram em vias de facto? – Sofia baixou a cabeça sem saber o que responder.
-Depois eu explico-te tudo. – Respondeu Filipe e saíram do carro. –Mas sim, envolvemo-nos.
Foram almoçar juntos a um
restaurante conhecido e depois de terminaram, começaram a longa
tarde de visitas a potenciais casas. A primeira casa era a ideal para duas
pessoas, mas demasiado pequena para três. Tinha apenas uma casa de banho apesar
de dois quartos, a renda era bastante acessível, mas não correspondia aos
desejos deles. Para além de que, a localização não era a mais agradável, apesar
de o centro de Lisboa ser uma boa zona a nível de transportes, era longe da
escola de Sofia e do centro de treinos de Filipe e Diogo.
Partiram para a segunda casa,
com uma localização mais agradável, bem próxima
do Seixal, o que era uma excelente localização para todos. E a casa
correspondia aos desejos de todos, não era muito grande, apesar de ter os 3
quartos que desejavam, e as duas casas de banho que pretendiam. Tinha uma
agradável sala de estar e a cozinha tinha o espaço suficiente para cozinharem e
comerem. Tinha tudo o que precisavam. Mas apenas tinham visto duas casa, tinham
de ver mais até tomar a decisão final.
Quando terminaram a visita,
todos estavam cansados. Tinha sido um dia muito agitado, principalmente para
Sofia e o dia anterior tinha sido igualmente forte tanto a nível físico como
psicológico. Que sabia que não se poderia esforçar em demasia, o corpo não
conseguia suportar muita exigência. O corpo ainda não tinha acabado de
desenvolver, mas também devido ao seu problema de saúde. Começou a sentir uma
dor no estômago, que embora fraca começou a aumentar a cada segundo mais e
mais. O irmão sabia bem qual era o problema de saúde da irmã e logo que
entendeu o seu estado de aflição, segurou-a e perguntou-lhe:
-Sofia os teus medicamentos? – Ela ouvira-o e tentava ao máximo fazer-se de forte, mas
as dores tornavam-se agoniantes.
-Eu não os trouxe. –
Respondeu com pouca força e coragem.
-Tens em casa? –
Perguntou limpado os suores frios que percorriam a testa e as feições de Sofia.
-Não Diogo. Eu não os trouxe... Mesmo. – Respondeu deixando bastante claro que a única possível
solução para a sua cura, não era sequer uma opção de momento.
-Como é que eles se chamam, sabes?
-Não.
-Então temos de ir ao hospital. – Disse e pediu a Bernardo para chamar uma ambulância,
mas Sofia agarrou na mão do irmão e pediu:
-Não, isto passa. Eu não quero ir para o hospital.
-Sofia temos de ir, senão ainda te acontece alguma coisa
mais grave.
-Tu sabes que se for para o hospital, vão chamar os pais.
Eu... Não quero. – Depois de dizer
estas palavras desmaiou.
Será que Diogo vai fazer o
que a irmã lhe pediu?
Ou será que a irá levar até
ao hospital? E será que os pais irão descobrir onde ela está?